sábado, 12 de março de 2011

Na onda do retrô caseiro

Roberto Nascimento - O Estado de S.Paulo
Na introdução, dois timbres de ficção científica se diluem em vozes, formando um panorama glacial sintetizado cuja estética é capaz de enganar o mais sagaz arqueólogo fonográfico. O ano é 2011 e não 1981, mas à medida que a faixa New Beat engrena, com sons plastificados e batida disco, é fácil de confundir. A ilusão sonora é cortesia de Chaz Bundick, produtor americano que atua sob o nome de Toro Y Moi e acaba de lançar seu segundo trabalho, Underneath the Pine, disco meticuloso em sua reformulação do pop do início dos anos 80. Bundick encabeça um nicho conhecido como o Chillwave, termo blogosférico para o punhado de músicos de estados diferentes dos EUA que fabrica sabores semelhantes de pop caseiro. Os cúmplices são Neon Indian, Small Black, Memory Tapes; em uma escala mais ampla, Ariel Pink e James Ferraro: todos criadores de sons dançantes, inspirado no new age, no rock mainstream do início dos anos 80, no pop new wave da MTV, e em sonoridades de trilhas sonoras da mesma época.
Ao longo de Underneath the Pine, Bundick se perde na nostalgia, mas produz cenas musicais ritmadas, coloridas por psicodelia e texturas elegantes. Talvez isso seja fruto de seu processo criativo, que, como muitos desses músicos, se dá entre quatro paredes, de forma hermética, o que parece facilitar o abandono de referências atuais em prol de uma estética musical de outros tempos, um sonho vintage vivido sem interrupção. Isso faz de Underneath the Pine um disco instigante. Somada à vastidão de reverbs e melodias suspensas nas composições de Bundick, a ambiguidade temporal cria uma atmosfera sutilmente desorientada, que age como hipnose ou analgésico. Musicalmente, Bundick sabe o que faz. Sua escolha de harmonias é inteligente. As canções se desdobram com modulações e acordes jazzísticos, formando segmentos aparentemente desconexos que se revelam bem costurados pela simplicidade das melodias. Ao microfone, o músico pede a bênção de Brian Wilson, santo padroeiro do pop dos anos 60, outra década igualmente vítima da obsessão da cultura pop com si mesma.

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